Neuronavegador garante cirurgias mais precisas

O serviço de saúde público do Amazonas passou por um avanço tecnológico no mês de junho, quando deu início à utilização do aparelho denominado Neuronavegador, da fabricante Brain Lab. De tecnologia alemã e fabricação americana, o aparelho foi adquirido pela Fundação Centro de Controle de Oncologia do Estado do Amazonas (FCecon) ao custo aproximado de R$ 600 mil. O equipamento veio acompanhado da garantia de remoções mais amplas das lesões neurológicas, minimizando os riscos de sequelas aos pacientes, já que reduz o tempo cirúrgico em até 50%, explica o neurocirurgião Carlos Michel Peres.

A máquina foi adquirida ao final de 2010, mas passou a ser utilizada em junho deste ano, após toda a equipe do Serviço de Neurologia da FCecon passar por treinamento junto ao fabricante. Embora já seja utilizada em um hospital particular da capital, o equipamento é o primeiro em uma unidade pública da região Norte do País.

“O interesse maior da máquina é para lesões cerebrais profundas, onde não há uma visibilidade aberta durante as cirurgias, como a craniotomia (abertura cirúrgica do crânio)”, ressalta Peres. Ele explica que esse tipo de lesão fica embaixo do cérebro, o que demanda cirurgias extensas para a localização e extração do tumor e, sendo assim, oferece mais risco de sequelas ao paciente. “Com o Neuronavegador ocorre uma localização precisa da lesão, com margem de erro de poucos milímetros, resultando em uma craniotomia menor”, destaca.

Do ponto de vista acadêmico, ele ressalva que, embora a máquina seja importante no processo de residência, não substitui o conhecimento médico e nem o processo habitual de cirurgia neurológica, haja vista que os estudantes poderão se deparar, no futuro, com situações onde terão que proceder sem o equipamento. “A localização (da lesão) os residentes têm que aprender sem o navegador”.

Na Fundação Cecon, os três especialistas em cirurgia neurológica (Drs. Moisés Vidal, Carlos Malaguchi e Carlos Michel Peres) já tinham prática no uso do aparelho, mesmo antes da aquisição da máquina pelo Estado. A primeira cirurgia realizada pela equipe da unidade hospitalar ocorreu há duas semanas, uma biópsia estereotáxica. De lá para cá, outros três procedimentos foram feitos: craniotomia para a retirada de tumor e uma laminectomia (coluna). Os pacientes se recuperam bem, informou o neurocirurgião Michel Peres.

A utilização do Neuronavegador em cirurgias de instrumentação de coluna também é importante, pois reduz a necessidade de irradiação ionizante (raio-x) no caso de inserção de parafusos. Conforme o neurocirurgião da FCecon, Moisés Vidal, o Neuronavegador inclui outros benefícios que o distinguem da cirurgia convencional, tais como a redução do uso de anestésicos e outros insumos cirúrgicos, diminuindo, consequentemente, os custos do procedimento.

“Além disso, ao reduzir os riscos de déficit motor, alteração visual, diminuição do nível de consciência e orientação, o paciente tem mais chances de ser funcional e voltar às atividades normais”, disse. O Serviço de Neurocirurgia foi implantado na FCecon há cerca de um ano e já contabiliza 33 cirurgias desde então.

Entenda a neuronavegação

A neuronavegação é uma importante ferramenta utilizada pelo neurocirurgião da atualidade, auxiliando no planejamento cirúrgico. Tem como objetivos principais diminuir o risco de lesões intra-operatórias, assim como acelerar a recuperação do paciente.

Porém, é baseado em imagens pré-operatórias. Desta forma, apesar de ser uma excelente aquisição tecnológica, não substitui o conhecimento médico. Com ele, o paciente tem a chance de ter o período de internação hospitalar reduzido.

De acordo com o neurocirurgião Cleomir da Silva Matos, chefe do Serviço de Neurologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas (HUGV), anteriormente à aquisição do Neuronavegador pelo Estado, o residente necessitava dirigir-se a outros centros para ter acesso a esta tecnologia, o que atualmente não se faz necessário, pois os treinamentos teóricos e práticos podem ser realizados em Manaus, a partir de uma iniciativa da FCecon em oferecer o aparelho para o uso dos residentes no módulo de Neuro-oncologia. A partir da ação, uma cirurgia já foi realizada pela equipe.

A mãe da paciente Auzenira Carvalho Ramos, 20, operada pela equipe do HUGV na Fundação Cecon, explicou como era a vida da filha antes da cirurgia. Moradoras do município de Tefé (a 523 quilômetros de Manaus), Verônica Carvalho e a filha trabalham com agricultura na localidade e se deslocaram para a capital após notarem que as dores de cabeça que Auzenira sentida há meses, estavam mais frequentes.

Em Manaus, a paciente ficou internada por três meses no Pronto-Socorro João Lúcio tratando o tumor diagnosticado por meio de ressonância e, em seguida, foi encaminhada à Fundação Cecon, onde passou por cirurgia há algumas semanas. “Agora, ela (Auzenira) se recupera bem, mas ainda está fraca. Mas acho que ela vai ficar completamente boa, pois ela já quer andar sozinha e apresenta sinais de melhora a cada dia”, disse.

De acordo com a agricultora, o atendimento da fundação foi primordial para a melhoria do estado de saúde da filha. “Gostei do atendimento da fundação, pois fui atendida na hora em que eu precisei”, disse, referindo-se a nova técnica cirúrgica adotada pelo hospital. A maior expectativa de Verônica é que a filha se recupere logo para voltar aos estudos e ajuda-la na lavoura no interior.

Planejamento

O chefe do Serviço de Neurologia do HUGV destacou que a nova tecnologia é essencial para o planejamento cirúrgico, pois o aparelho faz com que o médico residente possa operar juntamente com o preceptor lesões profundas, assim como lesões em áreas nobres, não sendo mais necessário o TFD (tratamento fora de domicílio).

Os principais procedimentos os quais pedem o auxílio da máquina, são: lesões profundas ou em áreas eloquentes (área da fala,visão e movimentos). Além disso, ressalta o cirurgião, a neurocirurgia pediátrica também está fazendo uso da tecnologia para obter melhores resultados, permitindo a abordagem de lesões complexas com maior segurança.

Contudo, a principal limitação no caso de uso do equipamento é o “brain shift”, ou, desvio cerebral, que pode ocorrer durante o procedimento cirúrgico. Após a manipulação cirúrgica, a localização de estruturas alvo pode ser modificada e até mesmo alguns milímetros podem alterar o trajeto de forma significativa, lembra o especialista.

Ele esclareceu que poucas unidades públicas no Brasil possuem um Neuronavegador e as que necessitam do aparelho se submetem a pagar aluguéis de R$ 14 mil mais R$ 8 mil de frete.

De acordo com Cleomir, a expectativa é que, com a chegada do aparelho na rede pública, sejam realizadas três cirurgias ao mês, incluindo estereotaxias, cirurgias para epilepsia e tumores da medula espinhal. “Esperamos em breve poder aumentar o número de cirurgias e assim beneficiar a população de Manaus”, frisou. Mais um procedimento está agendado para a próxima quarta-feira (13).